Safari de guerra: O que se sabe sobre snipers estrangeiros em Sarajevo?
- 18/11/2025
O anúncio de uma investigação em Itália sobre supostos "atiradores de elite de fim de semana" que pagaram para disparar sobre civis durante os quatro anos de cerco em Sarajevo reacendeu as feridas da capital bósnia.
Entre abril de 1992 e fevereiro de 1996, Sarajevo foi vítima do mais longo cerco da história moderna.
Segundo vários meios de comunicação social italianos, o Ministério Público de Milão abriu uma investigação sobre as supostas viagens de italianos ricos que se divertiam atirando de cima dos edifícios contra civis presos na cidade, mas foram poucos os pormenores divulgados.
A justiça bósnia, que se ocupou das mesmas acusações em 2022, afirma que ainda está a conduzir a sua investigação.
Eis o que se sabe sobre este caso, 30 anos após a guerra que devastou a Bósnia e causou mais de 100.000 mortos.
O que aconteceu durante o cerco?
No início de abril de 1992, as forças sérvias da Bósnia, que recuperaram armas do Exército Federal Jugoslavo, lançaram um cerco a Sarajevo. Em quatro anos, mais de 11.500 pessoas foram mortas na cidade, incluindo várias centenas de crianças, segundo números oficiais bósnios.
Os nomes das crianças assassinadas estão hoje gravados num memorial no centro da cidade -- uma lembrança diária da tragédia que Sarajevo sofreu.
Muitas dessas vítimas foram mortas por atiradores posicionados nas colinas em redor da cidade - e a maior artéria da cidade foi batizada pelos jornalistas internacionais de "Sniper Alley" durante a guerra, constituindo uma forma de aterrorizar a população civil, explicou em várias sessões dos julgamentos o Tribunal Penal Internacional para a ex-Jugoslávia.
Nenhum atirador furtivo ('sniper') foi pessoalmente responsabilizado, pois todas as condenações visaram os responsáveis e o comando.
As primeiras menções ao 'sniper safari'
Somando-se ao horror do cerco, os primeiros artigos que mencionavam o 'turismo de guerra' foram publicados no jornal Oslobodjenje.
A 1 de abril de 1995, na primeira página, o jornal titulou "Sniper Safari em Sarajevo". Abaixo, em várias colunas, o Oslobodjenje menciona "testemunhos arrepiantes sobre o 'turismo de guerra'" e evoca "um oficial sérvio [que] propôs a um jornalista italiano disparar contra uma mulher idosa".
"Eles preferem disparar contra crianças", leu-se noutro subtítulo.
O artigo cita meios de comunicação social italianos que relatam testemunhos sobre a "guerra de fim de semana" em Sarajevo e acusações apresentadas perante um "Tribunal Popular" em Trento.
Trinta anos depois, num artigo publicado em meados de novembro no portal da Radiosarajevo, um ex-oficial dos serviços secretos do exército da Bósnia-Herzegovina, Edin Subasic, conta que, em 1993, teve acesso a relatórios de interrogatórios nos quais um prisioneiro sérvio teria mencionado caçadores italianos a caminho de Sarajevo na companhia de voluntários também com a mesma nacionalidade.
"Homens ricos pagam às forças sérvias em Sarajevo para poderem disparar contra os muçulmanos", teria dito o prisioneiro, segundo o texto de Subasic.
Na época, não foi aberta nenhuma investigação judicial. Os serviços secretos bósnios teriam alertado membros dos serviços secretos italianos em Sarajevo. Entretanto, passaram-se décadas antes que o caso voltasse novamente à tona.
Abertura de investigações
Benjamina Karic tinha 1 ano quando a guerra eclodiu na Bósnia. Em 2022, já como presidente da câmara de Sarajevo, assistiu à exibição de um programa que a comoveu, durante um festival de documentários organizado pela Al-Jazeera Balkans.
O documentário, intitulado "Sarajevo Safari", realizado pelo autor esloveno Miran Zupanic, abordava essas acusações de 'turismo de guerra'.
Poucos dias depois de o ter visto, a presidente da câmara apresentou queixa e o Ministério Público bósnio tomou conhecimento do caso -- sem que se tenha conhecido qualquer pormenor desde então.
Em agosto passado, Karic contactou o jornalista italiano Ezio Gavazzeni, que também apresentou queixa em Milão, e enviou uma queixa à justiça italiana, através da embaixada italiana em Sarajevo.
"Toda uma equipa de pessoas dedicadas está a trabalhar para garantir que a queixa não fique sem resposta", prometeu recentemente Karic no Facebook. "Não vamos desistir!", garantiu.
Na segunda-feira, durante um programa de televisão italiano, o ex-juiz Guido Salvini, que ajudou Gavazzeni a construir o caso, explicou que o jornalista tinha feito "um trabalho considerável", "baseando-se em fontes locais e testemunhas de ambos os lados".
O Ministério Público de Milão não divulgou o conteúdo da queixa e não respondeu aos pedidos de informação da agência noticiosa France-Presse (AFP).
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