Legado de Mahsa Amini perdura no Irão três anos depois da sua morte
- 15/09/2025
A morte da jovem curda de 22 anos, durante uma visita a Teerão, a 16 de setembro de 2022 - ao fim de três dias em coma no hospital, para onde foi transportada após ser detida e espancada sob custódia policial porque o seu 'hijab' não estava suficientemente ajustado e deixou à mostra uma madeixa de cabelo - desencadeou protestos populares com forte tom feminista, com jovens iranianos a clamar pelo fim da República Islâmica, repetindo palavras de ordem como "Mulher, vida, liberdade!".
Os protestos foram esmagados pela repressão estatal, que fez 500 mortos e 22 mil detidos, mas o seu espírito persiste até hoje numa espécie de desobediência civil, contra a qual o Governo teocrático parece ter atirado a toalha ao chão, por enquanto.
Muitas mulheres iranianas deixaram de usar o véu islâmico após os protestos, apesar da repressão que incluiu detenções, chicotadas e apreensão de veículos.
A repressão não conseguiu, contudo, atingir os seus objetivos e verificou-se um certo alívio da pressão.
"O facto de as patrulhas da polícia da moralidade terem desaparecido das ruas e de as medidas contra quem não usa véu terem sido atenuadas é uma conquista absoluta da resistência feminina, e devemos isso em grande parte a Mahsa Amini", declarou Niloofar, arquiteta de 27 anos, citada pela agência noticiosa espanhola, EFE.
"Mahsa mudou a história do Irão", assegurou esta habitante de Teerão, que não usa véu.
A jovem considera que "a atmosfera se descontraiu" e sente agora "um pouco mais de espaço", embora "não a liberdade total" para as mulheres no país persa.
Esse "espaço" deve-se, em parte, ao governo do presidente reformista, Massoud Pezeshkian, que suspendeu em dezembro uma lei que impunha penas mais pesadas para quem não usasse o véu islâmico e, um mês depois, anunciou que não seriam tomadas quaisquer medidas contra as mulheres que não cobrissem o cabelo, no meio de críticas dos setores conservadores.
O Governo reformista - uma fação política que pretende uma abertura social - procura também legalizar a emissão de cartas de condução de motociclos para mulheres, algo proibido desde a criação da República Islâmica, em 1979.
"Com Pezeshkian na presidência, há um discurso mais moderado. Se o mandato de Raisi [anterior presidente ultraconservador] tivesse continuado, penso que as coisas seriam mais difíceis para as mulheres que querem ser livres", sustentou Niloofar.
Nas ruas de Teerão, é percetível que as mulheres se sentem um pouco mais livres, com o cabelo descoberto e roupas mais modernas, mas muitas consideram tratar-se de uma pequena conquista cuja duração é desconhecida.
"Acho que continuamos sob vigilância e talvez mais tarde, não sei se durante o atual governo, voltem a atacar as mulheres", disse Sahar, funcionária de 39 anos de uma loja de maquilhagem.
A mulher recordou como durante o governo do primeiro presidente reformista, Mohamed Khatami (1997-2005), houve mais liberdade para as mulheres mas, no executivo seguinte, do conservador Mahmud Ahmadinejad (2005-2013) foram criadas as temidas patrulhas da moralidade.
"Enquanto não houver uma lei que garanta às mulheres a liberdade de vestuário, não haverá uma garantia real de que a repressão não se repita", sublinhou Sahar.
Para a engenheira informática Parisa, de 41 anos, ainda há um longo caminho a percorrer, dadas as limitações que a República Islâmica impõe às mulheres, como presumir ter direito a metade das heranças e necessitar da autorização do marido para trabalhar ou estudar, entre outras.
"O trágico assassínio de Mahsa foi o início de um despertar", opinou esta mulher, que defende ser preciso continuar a lutar por mais direitos.
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