Cinquenta anos depois, a luta continua nas palavras e artes dos "dredas" de Angola

  • 08/11/2025

Os artistas juntaram-se na semana passada em Luanda para assistir à projeção de "É Dreda Ser Angolano", filme de 2008 integrado no ciclo de cinema DIPANDA 50, promovido pelas associações Cinéfilos & Literatus e @kinoyetu.

 

Através desse filme, que retrata um dia em Luanda no pós-guerra, revelando a cidade através da música, das histórias e das vivências populares, expressaram à Lusa as suas desilusões e um olhar pouco otimista sobre o futuro.

O rapper MCK, um dos intervenientes, diz que a sua geração --- é de 1981, poucos anos após a independência --- encara a independência como um "marco histórico" que permitiu aos angolanos ser donos do seu próprio destino, mas aponta um saldo negativo em várias áreas, como a saúde.

Dá como exemplo os três presidentes que procuraram assistência no estrangeiro: Agostinho Neto, o primeiro, morreu em Moscovo, José Eduardo dos Santos, em Barcelona, 'de doença prolongada', e o atual Presidente "apesar de várias unidades hospitalares, cura-se no estrangeiro".

MCK diz também que é fundamental "lutar para destruir um imaginário colonial muito presente na vida dos angolanos", sobretudo da elite, que faz uma vida residual em Angola e quase tudo em Portugal, na metrópole".

"Acho que é muito ofensivo todos os anos assistirmos a nacionalistas que lutaram pela independência morrerem de doença prolongada na metrópole", para onde muitos "fogem de uma vida miserável em Angola", enfatiza o rapper.

Acredita que a esperança reside "na luta das pessoas para serem cidadãos" e defende uma "educação cívica e um espírito de pertença", criticando "o dinheiro que é retirado de Angola e investido na metrópole" deixando no país "o vazio" da falta de emprego.

MCK lamenta que "a explosão demográfica não se transforme em capital humano" e ensaia alguma futurologias sobre o que será Angola daqui a 50 anos: "sem luta vai ser igual". Apela, por isso, ao povo que se assuma como titular da soberania, já que os políticos apenas "têm um poder que lhes é emprestado pelo exercício da cidadania, através do voto".

Também Luaty Beirão, ativista e rapper, tem dificuldade em encontrar a esperança. "Como é possível 50 anos depois da independência e 23 anos depois do calar das armas, continuarmos a ter esta guerra social que faz com que pouca gente esteja satisfeita no seu país, no país onde nasceu", questiona.

Assume que talvez seja o masoquismo e "um pouco de egoísmo" que o levam a escolher ficar em Angola e expor-se a uma realidade "muito perversa".

"Ainda aqui estamos, ainda não desistimos, ainda há um pouco de combustível nesse tanque (da esperança)", completa.

A próxima década será decisiva para o que for Angola em 2075, afirma Luaty, apelando a quem governa que invista nos cidadãos, "sobretudo na educação das crianças".

"Temos de poder encontrar a dignidade sem ser traindo uns aos outros, procurando a sobrevivência individual", reforça, admitindo estar "numa fase pessimista".

Fala da independência como uma necessidade, lamentando que o que se conseguiu depois de conquistar essa autodeterminação, não deixe os angolanos orgulhosos e felizes.

"Teríamos de ser muito facciosos para estar a pintar com coisas bonitas este quadro que temos hoje (...) há uma nuvem muito escura em cima de nós", contrapõe.

Orlando Sérgio, ator e encenador, nascido em 1960, ri-se da provocação lançada a propósito do regresso dos angolanos à metrópole, onde chegou "deslumbrado" ainda antes do 25 de Abril e da qual recorda "a desilusão" de Lisboa.

Depois da revolução em Portugal, que "trouxe um lado oculto e o caos à metrópole" , acompanhou o processo político e regressou a Angola onde militou em organizações políticas como os Comités Amílcar Cabral e a Organização Comunista de Angola, "que não foram bem recebidas" pelo MPLA e o levaram à prisão durante dois anos.

Sublinha que sentiu sempre respeito pela liberdade que "não é para ser vivida à distância". "Eu quero ser livre hoje", vinca, mostrando-se convicto de que "as pessoas que aprendem a viver em liberdade poderão construir futuros melhores".

Paradoxalmente, continua, a geração que conquistou a independência "prestou depois um péssimo serviço, pegou no dinheiro do país e expatriou para a metrópole", onde também agora os mais jovens "procuram melhores condições de vida, sobretudo, e se calhar alguns também liberdade".

Gégé Mbakudi, artista plástico, tem metade da idade deste novo país nascido em 11 de novembro de 1975.

Retoma o título do filme e confirma que "é preciso ser 'dreda' para viver em Angola".

O "dreda" é "alguém que tem disponibilidade para se mexer e fazer as coisas acontecer" e que, apesar das dificuldades, "consegue contornar e arranjar outros caminhos para sobreviver", explica.

Este é também o seu percurso como artista, que usa a cidade como matéria-prima e que espera ver daqui a 50 anos "uma versão muito melhor de Angola".

 Leia Também: Tchizé dos Santos questiona legitimidade de João Lourenço

FONTE: https://www.noticiasaominuto.com/mundo/2884978/cinquenta-anos-depois-a-luta-continua-nas-palavras-e-artes-dos-dredas-de-angola#utm_source=rss-ultima-hora&utm_medium=rss&utm_campaign=rssfeed


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